Beet/nick #002: opinar é fácil (sustentar, nem tanto)
Nesta edição, a gente observa o que acontece quando o conteúdo deixa de ser território fechado e entra no cotidiano.
Nesta edição, olhamos para como o conteúdo circula e se transforma quando deixa de ser exclusivo para se tornar vivido.
Plataformas como Letterboxd, Substack e Canva ampliaram o acesso à expressão criativa, e o resultado é um ecossistema onde críticos consagrados, comentaristas casuais e curadores por afinidade convivem, influenciam e até se confundem.
A crítica continua sendo necessária (talvez mais do que nunca!) mas já não fala sozinha, porque onde antes havia autoridade isolada, agora há comunidades articuladas.
A questão já não é quem pode opinar, mas que valor damos ao repertório por trás da opinião.
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Por fora, folhas que chamam atenção. Por dentro, raiz profunda, cor que mancha, gosto que fica. Ela nasce firme, carrega história, e brota conectada à terra — não ao feed. O que entrega ao mundo não é filtro: é sustança. Por isso, a beterraba é nosso vegetal favorito. É assim que a gente pensa conteúdo: começa fundo, com pesquisa, intenção e escuta. Só depois vem à tona — leve no ritmo, denso no sentido.
Porque o que nasce raso, seca. E o que se esconde demais, apodrece antes de amadurecer.
🎨 Como o Canva matou o medo da folha em branco
Com o projeto THE WORK, plataforma mostra que não quer mais ser só “fácil”: quer ser essencial. E está mirando o coração (e os budgets) das equipes de criação.
Se você ainda vê o Canva como um lugar para pegar uns templates e resolver a vida rapidinho, talvez precise pegar um café, liberar uma hira da sua agenda e abrir essa apresentação.
A série THE WORK, recém-lançada pela marca, mostra o que acontece quando uma plataforma antes até que meio subestimada começa a flertar com o status de creative OS. E faz isso com a maior cara de pitch para CCOs — não para influencers.
Templates corporativos? Tem. Funcionalidades de IA? Também. Mas o que chama atenção de verdade é o reposicionamento narrativo: o Canva não quer mais ser “fácil”, quer ser essencial. Com cases da FedEx, Zoom, Hubspot e da própria equipe interna da Canva, a série revela como a simplicidade virou diferencial de produto.
Num mundo onde todo mundo precisa comunicar, mas nem todo mundo tem um estúdio criativo à disposição, essa é uma lição importante: colaboração, consistência e velocidade são os novos pilares do design cotidiano.
📝 O fundo (literal) dos criadores
Substack lança um fundo de 20 milhões de dólares para investir em criadores com profundidade, consistência e zero necessidade de viral. É uma nova lógica de capital criativo?
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anunciou um fundo de 20 milhões de dólares para investir diretamente em criadores — com dinheiro vivo, proposta bem definida e liberdade editorial total. A aposta é criar um modelo alternativo ao ad-sense da internet, baseado em assinaturas, comunidade e autonomia autoral.Não é a primeira vez que a plataforma se posiciona como antídoto ao modelo de monetização algorítmica, mas agora ela entra no jogo com mais ambição e mais risco: o fundo será distribuído entre projetos que prometem qualidade e consistência, mesmo que ainda não tenham escala.
Segundo a reportagem da Entrepreneur, a proposta é atrair escritores, jornalistas, ensaístas, cronistas e criadores híbridos que querem publicar com profundidade, sem depender de métricas de engajamento. Por enquanto, está disponível apenas nos EUA.
A gente sabe que nenhum fundo resolve sozinho o dilema da remuneração criativa. Mas essa aposta mostra que o conteúdo independente está deixando de ser só uma paixão paralela e ocupando espaço real nas decisões de investimento, visibilidade e distribuição. Pra isso, precisa ir além do botão de donate.
🎥Letterboxd: a rede social onde só vale dar opinião se for com cinismo e bagagem
Plataforma que nasceu como diário de filmes virou credencial cultural entre jovens criativos. Mas o que faz o Letterboxd ser mais do que um IMDb com piada interna?
Se o Instagram virou catálogo, o TikTok virou vitrine e o X virou ringue, o Letterboxd virou clube. Mas um clube peculiar: com 14 milhões de membros, todos eles prontos para te julgar se você der mais de três estrelas para "Clube da Luta", se você não entender "Aftersun" ou dizer que "Bacurau" é “superestimado” (spoiler: não é).
Tem até vídeo sobre isso: o youtuber Lucas Diniz foi gentilmente massacrado ao dar três estrelas para "Ainda Estou Aqui" — com direito a ataque coletivo no próprio Letterboxd:
No Letterboxd, a estética é da ironia, mas o afeto é real. A plataforma nasceu como um diário de filmes para cinéfilos e virou, nos últimos anos, o lugar onde Millennials e Gen Z constroem seu repertório coletivo. Nada de algoritmo, trending artificial ou review de especialista pago: aqui, a crítica é meme, é inside joke, é tentativa de legenda autoral para a própria identidade. É “cinema como linguagem nativa”.
E os dados confirmam: o crescimento do Letterboxd se acelerou durante a pandemia, mas se manteve estável porque o modelo combina funcionalidade com senso de comunidade. A plataforma oferece mais do que um sistema de avaliação — ela cria um espaço onde perfis viram registros pessoais de gosto, hábitos e referências. Há usuários que se dedicam a um único gênero, outros que criam listas temáticas inusitadas, e também quem use a ferramenta apenas para acompanhar o que os amigos estão assistindo.
A força do Letterboxd está justamente nesse formato híbrido: funciona como diário, rede social e catálogo ao mesmo tempo. Diferente de IMDb ou Rotten Tomatoes, que priorizam médias e rankings, o Letterboxd constrói memória e identidade de consumo, algo que se tornou raro (e valioso) no fluxo acelerado das timelines.
📎 Pra entender melhor, leia:
How Letterboxd Went Mainstream (Fast Company)
Letterboxd: Where Film Gets Social (Atlanta100)
💬 E se você tem um perfil por lá, manda seu @. A gente promete não te julgar (muito) por dar 5 estrelas pra um filme da Saga Crepúsculo.
🎧É Sobre Isso #10 O vazio na comunicação contemporânea
Você sabia que só 1% dos podcasts chegam ao décimo episódio? Esse é um dado real. E a gente chegou! Chegou com zoeira, pensamento crítico, e algum ranço contra frases prontas - justificável, claro.
No episódio novo, o décimo, a gente pergunta: por que tanta ideia vira só frase de efeito? E por que continuamos caindo nessa?
Tem de tudo: “conteúdo é rei”, “conversa é deus”, “gestão por objetivos”, “reengenharia”, “growth hacking”, “intention economy”, “humanizar a marca” e aquela sequência infinita de chavões que substituíram o pensamento por estética de carrossel.
O episódio é uma jornada: Gaía, Cris, Gui e Ale (a Cata furou por que estava em Londres) vão da mão invisível de Adam Smith ao meme com GIF da Juliette. Com provocações, piadas e umas verdades doloridas.
É Sobre Isso é o podcast quinzenal da Beet e da Ampère sobre os desafios da comunicação contemporânea, quinzenalmente em todas as principais plataformas de áudio (e no Youtube!)
👉🏼 Roteiro e pesquisa de Alexandre Maron.
👉🏼 Direção e produção de Anna Maron.
👉🏼 Edição de áudio e vídeo de Jessica Correa.
👁️ O fim do monopólio das notícias?
Relatório do Reuters Institute confirma: redes, vídeo e creators já são a principal fonte de notícias para os jovens – e a imprensa tradicional, mesmo ainda confiável, perdeu tração. E agora?
Todo ano, o Digital News Report, do Reuters Institute, funciona como um termômetro da relação entre pessoas, plataformas e informação. Mas a edição 2025 trouxe um ponto de virada. A geração Z, definitivamente, deixou a imprensa tradicional para trás. Em 44% dos casos, jovens de 18 a 24 anos dizem se informar principalmente pelas redes sociais e plataformas de vídeo. YouTube e TikTok tomaram o lugar que antes era ocupado pelo telejornal ou pelo site de notícias — com muito mais ruído, mas também com mais afinidade.
É uma mudança que tem mais a ver com forma do que com conteúdo. A confiança na imprensa profissional segue relativamente alta em muitos mercados, especialmente em comparação com influenciadores e figuras políticas. Mas o acesso ao conteúdo se deslocou para outros ambientes: mais rápidos, personalizados, intermediados por algoritmos. A leitura deu lugar ao scroll. O apresentador cedeu espaço ao criador com câmera frontal.
Além disso, um novo ecossistema de mídia está se formando. Em países como Estados Unidos, Tailândia e Índia, a penetração de vídeo como principal fonte de notícia é esmagadora, e traz um novo tipo de mediador da informação: os “newsfluencers”. Gente como Joe Rogan (citado por 22% dos jovens norte-americanos como fonte de notícias ou comentários) ou criadores nativos do TikTok que misturam opinião, humor e pauta quente no mesmo vídeo de 90 segundos. Notícia e entretenimento viraram gêmeos siameses.
Plataformas como X seguem relevantes, mas com inclinação ideológica visível. O estudo mostra que, desde a compra por Elon Musk, a base da rede ficou mais conservadora, ainda que o uso geral tenha crescido em mercados como EUA, Austrália e Polônia. Enquanto isso, apostas como Threads e Bluesky ainda não passaram de bolhas experimentais: ambas têm menos de 2% de adoção global para consumo de notícias.
Aquilo que fica no ar, é: o que vai ocupar o vácuo deixado pela imprensa tradicional como mediadora pública? É preciso compreender como as pessoas informadas se formam agora. Se o papel da mídia era organizar o caos, hoje o caos está organizado por filtros personalizados. Cada um com sua verdade, seu viés, seu criador favorito. Um poder que mudou de mãos, e parece que está quicando.
📺 YouTube com sangue nos olhos
Em meio à pressão por retenção e competição com TikTok e podcasts, o YouTube lança uma leva de recursos que mostram uma coisa: ele não quer ser só plataforma. Quer ser infraestrutura de tudo.
Na corrida pela atenção criativa, o YouTube decidiu acelerar. Durante o Brandcast 2025, a empresa anunciou uma série de atualizações que afetam tanto quem cria quanto quem consome, com um recado bem claro: a guerra da atenção não tem zona neutra.
Alguns destaques:
Shorts com link para vídeo longo: agora, se um conteúdo curto viralizar, ele pode servir de entrada direta para vídeos mais extensos — ideal para construir jornadas de engajamento real.
Playlists com anúncios personalizados: o novo formato permite que marcas apareçam entre vídeos selecionados pelo próprio criador, criando uma experiência quase de curadoria patrocinada.
Nova API para sincronizar Shorts e e-commerce: sim, você vai poder comprar sem sair da rolagem. Sim, isso muda o jogo do social commerce.
Mais recursos para criadores-voz: criadores focados em áudio e podcasts vão ganhar ferramentas de edição e distribuição otimizadas dentro da própria plataforma.
O pano de fundo dessa movimentação: o TikTok mordendo o calcanhar, o Spotify se consolidando em áudio e o próprio Substack conquistando leitores (e ouvintes) com newsletters + voz.
A Rafaela Lotto, CEO do Youpix, explica direto da praia do Google em Cannes:
🪩 Beet-it
A , autora da newsletter sobre design mais legal do Substack, explica o que existe em um ícone:
A mandou essa direto de Cannes: os creators chegaram, mas sem ficha técnica.
O questiona, na Marmitex: sem meu post, quem sou eu?
A comenta sobre direito autoral na era da IA, na sempre ótima Galáxia:
, da Brew, conta a história da Bic (sim, a caneta):
🏁 Sharing is caring
Obrigada por ler até aqui!
A beet/nick volta em 15 dias. Mas você pode (e deve) lembrar de nós antes disso. Então salve esse post para ler quando quiser, e encaminhe pra quem também vai gostar de nos conhecer: